APARIÇÕES DE NOSSA SENHORA: SIM OU NÃO?


Em síntese: A Igreja sabe que a revelação das verdades da fé se encerrou com a geração dos Apóstolos. De então por diante nenhum artigo de fé pode ser acrescentado ao Credo. Todavia a Igreja admite a possibilidade de revelações particulares do Sagrado Coração de Jesus, da Virgem Maria ou de outros Santos; tais aparições têm por objetivo lembrar aos homens a mensagem do Evangelho, principalmente o dever de orar e converter-se. — Ao examinar tais revelações, as autoridades eclesiásticas são muito cautelosas, a fim de não confundir fenômenos meramente psicológicos e parapsicológicos com intervenções do Céu. Sobre muitos casos tidos como genuínas aparições a Igreja tem proferido juízo negativo, desaprovando-os; sobre outros não se tem manifestado por não ver razões favoráveis ou desfavoráveis; em alguns poucos casos tem autorizado e fomentado a devoção ao S. Coração de Jesus ou à Virgem SS., fundamentada nos frutos espirituais e nos sinais decorrentes das alegadas aparições; tal é o que se dá em Paray-Le-Monial, Lourdes e Fátima…

Têm-se multiplicado as notícias de aparições da Virgem SS. com revelações, mensagens e também com lágrimas, em várias partes do mundo. Algumas estatísticas revelam a freqüência do fenômeno: assim Bernard Billot O.S.B. contou 232 casos entre 1928 e 1975 ocorridos em 32 países, sendo que só na Itália 78 casos. — De 1975 a nossos dias poder-se-iam enumerar muitos outros casos, inclusive no Brasil. Quanto aos casos de lágrimas de Maria SS., contam-se treze entre 1952 e 1972.

Daí a pergunta: que atitude deve tomar um fiel católico diante de tão dilatada onda de extraordinário? É recomendável dizer-lhe Sim? Um Não seria falta de fé? — É o que vamos considerar nas páginas subseqüentes.

1. A ATITUDE OFICIAL DA IGREJA

Antes do mais, convém lembrar que se distinguem revelação pública e revelações particulares. A primeira se destina a toda a Igreja de todos os tempos e lugares e é transmitida pelos Profetas, pelo Senhor Jesus e pelos Apóstolos. Ao contrário, as revelações particulares se destinam a uma pessoa ou um grupo de pessoas para corroborar a fé e suscitar um reafervoramento dos fiéis; são transmitidas por homens e mulheres especialmente agraciados; não se impõem à fé dos católicos, mas podem merecer respeito na medida em que a Igreja permita a sua propagação.

A necessidade de estabelecer critérios para avaliar as revelações particulares impôs-se à Igreja a partir do século XV. O Concílio de Basiléia (1431) viu-se obrigado a abordar o assunto quando tratou da canonização dos Santos.

A Igreja quer ser cautelosa diante dos fenômenos extraordinários, pois estes se apresentam muitas vezes como algo de ambíguo: tanto podem ser sinais oriundos de Deus como podem ser expressões do psiquismo humano sugestionado ou doentio. Por isto a Igreja manda examinar com precisão cada caso. O resultado da pesquisa pode ser triplo:

– declaração de que, no caso, nada de transcendental pôde ser apurado, havendo mesmo indícios de sugestão ou talvez morbidez da parte dos “videntes”. Na hipótese de morbidez e elementos antiéticos (exploração financeira, vaidade, fraude…), a Igreja desabona a “revelação”. Exemplo de desabono é o Aviso ou Advertência do S. Ofício datada de 29/1/1954, declarando que não consta, em absoluto, terem origem sobrenatural as promessas que o Senhor Deus teria feito a Santa Brígida;

– reticências ou silêncio devido à falta de indícios que levem a abonar ou desabonar a “revelação”; o exame das ocorrências nada conclui em tais casos. Em conseqüência, a Igreja pede que não haja culto público inspirado pelas pretensas aparições;

– permissão para que se divulguem a “revelação” e sua mensagem. Nunca, porém, a Igreja incorpora o conteúdo de tal revelação ao patrimônio da fé transmitido por Jesus Cristo e pelos Apóstolos; aliás, toda autêntica revelação não pode ser mais do que a explicitação do que já está contido no depósito da revelação pública ou nos artigos do Credo oficial. Como dito, a revelação pública ou das verdades de fé se encerrou com a geração apostólica. A fórmula exata da atitude da Igreja diante de uma revelação aceitável é, por exemplo, a resposta da S. Congregação dos Ritos ao arcebispo de Santiago do Chile datada de 6/2/1875; este prelado, tendo pedido o parecer da Santa Sé a respeito de uma aparição ocorrida em seu país, recebeu a seguinte resposta:

“Embora a mencionada aparição não tenha sido aprovada pela Sé Apostólica, todavia não foi reprovada nem condenada pela mesma, mas,sim, permitida como objeto de fé piedosa, … fé humana ([1]), depositada em piedosa tradição (como nos referem) e confirmada por testemunhas e documentos válidos” (Decreta authentica Congregationis S. Rituum, t. III. Romae 1900, no 3336, p. 48).

A mesma fórmula foi repetida pela Congregação dos Ritos em 12/5/1877, quando três Bispos lhe perguntaram se a Santa Sé havia aprovado as aparições de Lourdes e La Salette (ibidem, no 3419, p. 79).

Por sua vez, Pio X, na encíclica Pascendi (1907), querendo promulgar normas em matéria de culto, de relíquias e de tradições piedosas, citou as decisões atrás mencionadas e as comentou brevemente.

Como se vê, na melhor das hipóteses a Igreja declara nada haver contra tal ou tal fenômeno de aparição. É claro, porém, que esta Declaração mesma tem peso e valor, pois supõe um exame doutrinário sério e cauteloso.

A título de complementação, observamos, que, segundo alguns teólogos, a Igreja chegou a dar um laudo de reconhecimento positivo às aparições do Sagrado Coração de Jesus a S. Margarida-Maria Alacoque em Paray-Le-Monial (ano de 1673). Com efeito; alguns documentos oficiais da Igreja aludem a essas aparições — o que parece tributar-lhes reconhecimento público; vejam-se o Breve de Beatificação de S. Margarida-Maria, o Decreto da Congregação dos Ritos datado de 1875, a encíclica Annum Sacrum de Leão XIII sobre a Consagração do gênero humano ao S. Coração de Jesus (15/5/1899) e a encíclica Miserentissimus Redemptor de Pio XI (8/5/1928). Pode-se opinar livremente a respeito do parecer de tais teólogos.

Em certos casos a Igreja pode ir além de uma aprovação negativa. Com outras palavras: além de reconhecer que tal ou tal revelação não fere a fé e a Moral, a Igreja pode permitir que se construa alguma capela ou santuário relacionado com a revelação em foco; pode permitir que se institua uma festa litúrgica ligada aos fatos… ou que se publiquem livros e estampem imagens ilustrativas; numa palavra: … pode permitir o culto público decorrente de tal aparição; foi o que se deu, por exemplo, com as aparições de La Salette na França (1846), com as de Beauring (1932) e Banneux (1933) na Bélgica, de Lourdes (1858) e Fátima (1917).
APARIÇÕES DE NOSSA SENHORA: SIM OU NÃO? APARIÇÕES DE NOSSA SENHORA: SIM OU NÃO? Reviewed by Unknown on setembro 15, 2017 Rating: 5